quinta-feira, 26 de junho de 2008

Fidelidade e Maçonaria


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1. INTRODUÇÃO: O presente artigo tem por objectivo principal discorrer sobre o significado da palavra fidelidade, observando tanto a conotação que lhe é emprestada no mundo profano quanto no mundo maçónico.
Para sermos rigorosos em nosso objectivo, em primeiro lugar recorremos aos léxicos e, posteriormente enveredamos pelos caminhos da filosofia até chegarmos ao conceito maçónico de fidelidade.

Evidentemente, face à natureza do trabalho, como também à exiguidade temporal, a pesquisa não chegou à exaustão.
Consequentemente cumpre-nos destacar que ao longo deste artigo tangenciaremos, por um lado, o significado da fidelidade no nosso quotidiano e, por outro lado, através destas observações procuraremos mergulhar no âmbito da filosofia para alcançarmos o nosso objectivo maior - a fidelidade, enquanto valor maçónico e princípio determinante da busca da felicidade - sem perder de vista que qualquer conceito é plástico e moldável ao longo do tempo.

Ou seja, o conceito insere-se em um processo dinâmico de observação da realidade concreta que tem como pressuposto básico o facto de que a variável temporal transcende uma simples coordenada para ser entendida como interioridade com três componentes: sucessão, simultaneidade e permanência.

2. FIDELIDADE: da abordagem quotidiana ao valor maçónico

Sob o aspecto da língua vernácula, nada mais prudente do que consultar os léxicos, para entendermos a origem e o significado de um vocábulo.
Neste sentido, buscamos em Houaiss (2001, p.1337), o significado e a etimologia da palavra fidelidade e lá encontramos:
Fidelidade - s.f - característica, atributo do que é fiel, do que demonstra zelo, respeito quase venerável por alguém ou algo;

1.1 observância da fé jurada ou devida;
2 constância nos compromissos assumidos com outrem;
3 Constância de hábitos, de atitudes( fidelização de clientes).

De outra forma, sob a óptica da Filosofia, esta para nós, se constituindo no mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes, sem dúvida, podemos enveredar pelos caminhos da ética para o entendimento mais preciso do significado da fidelidade.
A ética ancora-se em dois conceitos fundamentais: o senso moral e a consciência moral.
O senso moral representa nossos sentimentos e nossas ações e, porque não dizer, a forma como nós humanos interagimos com os nossos semelhantes e construímos conhecimento e formatamos hábitos e costumes.

Este conceito - de senso moral - traz de forma subjacente a ideia de costumes tradicionais, aceites e legitimados por uma sociedade, a forma como seus membros devem se portar e quais suas obrigações para com esta sociedade.

A consciência moral, por seu turno, nos remete ao pensar e a tomada de decisão. Em outras palavras, a consciência moral pode ser muito bem representada pelo seguinte exemplo: ao termos que definir, de pronto, sobre o que fazer em determinada situação em que somos instados a tomar uma decisão, inicialmente, temos de justificar esta decisão para nós mesmos e posteriormente para os outros.
Evidentemente, quando falamos de justificativa de uma decisão, referimo-nos às razões de nossa decisão, como também ao fato implícito de termos de assumir as consequências dela decorrentes.
Portanto, na esteira destas considerações de ordem ética, a fidelidade assume a condição de valor moral e consequentemente, não mais pode ser observada sem um pressuposto básico - a relação entre seres humanos, como também, de forma mais abrangente, entre a natureza orgânica e inorgânica - de modo que haja uma condição de cumplicidade e envolvimento entre partes que interagem e/ou mantém certo vínculo.

A fidelidade, portanto, vista sob a óptica da filosofia representa uma inter-relação entre o homem, enquanto representante da sociedade e a natureza, tanto a natureza orgânica quanto a natureza inorgânica.

Caminhando ao encontro destas considerações podemos inferir que a fidelidade além de ser um valor moral é também um valor social e, representa na sua prática quotidiana, um processo de catarse que, faz o homem passar do estado egoístico - passional para o estado ético - político.
Por outro lado, se nos reportamos ao significado da fidelidade no âmbito da ordem maçónica, sem dúvida, podemos aquilatar que, este, transcende tanto ao conceito da língua vernácula quanto ao conceito da filosofia.

Somente para fixar ideias, observemos algumas passagens do processo histórico de iniciação de um profano:

  • Ao ser iniciado na ordem, o neófito, assume um compromisso voluntário e moral de praticar a fidelidade em sua essência, enquanto ser humano, isto é, no conjunto das suas relações sociais;
  • Esta fidelidade do neófito se ancora na sua liberdade de expressão e acção, sem, contudo perder a ideia de limite;
  • A forma como ele é recebido - o ritual de iniciação - o conduz de forma metafórica através do processo histórico de evolução do homem e sua interacção com a natureza. Ou seja, o ritual de passagem - a iniciação - representa de forma sublime o vínculo entre partes, de um lado o mundo profano - a natureza(água, fogo, ar, animais, plantas, astros, pedras, metais, terra, humanos) - e de outro lado o mundo maçónico - as singularidades da ordem maçónica, seus segredos, suas alegorias, sua simbologia e a sua prática ritualística.

Observando as colocações acima elencadas, e sobre elas fazendo uma reflexão, podemos compreender que no âmbito maçónico, o homem, enquanto ser gregário se predispõe de forma transcendente a viver o estado da arte da sociedade, ou seja, buscar a perfeição e o convívio pleno com seus semelhantes.

Esta convivência com seus semelhantes, todos diferentes, mas não desiguais, obriga o homem a pensar e construir o seu espaço na medida em que através destas trocas de informações constrói valores éticos e morais.

E, nesta dinâmica de interacções, nós maçons, observamos de forma muito transparente e, porque não dizer, sem nenhuma opacidade, a prática e a consolidação do objectivo mais profundo e sublime da maçonaria - fazer feliz a humanidade.

Esta felicidade traz consigo de forma latente a fidelidade, ou seja, um processo de construção de valores éticos e morais que dá sustentação ao compromisso voluntário que o neófito assume com a maçonaria. Igualmente, este processo possibilita a construção e consolidação de novos hábitos e costumes que nos fazem enxergar nossos semelhantes como diferentes e não como desiguais.

Ou de outra forma, a busca da perfeição e o convívio pleno e harmónico com nossos semelhantes tanto no âmbito maçónico quanto no mundo profano é o que admitimos como a verdadeira Fidelidade.
Em síntese, o que distingue a fidelidade, enquanto valor maçónico, da fidelidade praticada no mundo profano é, no nosso entendimento, a voluntariedade.

E, para enriquecer este trabalho, gostaríamos de deixar gravado o entendimento do ilústre filósofo francês Gilles Deleuze(1925 - 1995) que ao ser instado a discorrer sobre o que é a Filosofia, assim se expressou:
" Muita gente pensa que a filosofia é uma coisa muito abstracta e para especialista. Eu creio e vivo de tal forma a ideia de que a filosofia não é uma especialidade que tento colocar o problema de outra forma. Quando se crê que a filosofia é abstracta, a história da filosofia fica também abstracta.......Um filósofo não é alguém que contempla nem mesmo alguém que reflecte: é alguém que cria. Cria um género de coisas de facto especiais: cria conceitos. O conceito não está pronto, não passeia pelo céu, não o contemplamos. É preciso cria-lo, fabricá-lo".

Este entendimento da filosofia consubstancia a ideia da criação de conceitos e, evidentemente, da criação do conceito de fidelidade, particularmente na ordem maçónica.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ordem maçónica, enquanto uma sociedade iniciática, cria e legitima conceitos que lhes dão sustentação tanto para a sua prática operacional - as lojas simbólicas - quanto para a reflexão em seus templos voltados para a prática da filosofia - as lojas de perfeição.

De outra forma, observando este facto - a criação e legitimação de conceitos pela ordem maçónica - sob a óptica da dialéctica e, levando-se em consideração o aspecto temporal podemos inferir que a mudança e a permanência, enquanto categorias reflexivas - uma não pode ser pensada sem a outra - representam talvez um pressuposto óbvio da vitalidade e longevidade dos cânones da maçonaria.

Em outras palavras, não podemos ter uma visão correta de nenhum aspecto da realidade humana se não soubermos situá-lo dentro do processo geral de transformação a que ele pertence, também não podemos avaliar nenhuma mudança concreta se não a reconhecermos como mudança de um ser (quer dizer, de uma realidade articulada e provida de certa capacidade de durar).

Neste sentido, sem nenhuma ambiguidade e explicitando o que apreendemos ao longo da nossa prática maçónica, podemos afirmar que: ao pensar o todo - a busca da felicidade da sociedade - a maçonaria não nega as partes, ou seja, não abstrai estas - as partes do todo - como também ao tratar as partes com suas diferenças o faz no seio da sociedade.
Ou seja, trabalhar a pedra bruta é uma metáfora que representa o trabalho das partes ao passo que a prática da liberdade, da igualdade e da fraternidade representa o tratamento do todo.

E, para finalizar, podemos inferir que a argamassa responsável pela consolidação e estabilidade da alvenaria maçónica tem um componente singular - a fidelidade -, que nada mais é do que uma construção colectiva do conhecimento.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. 12ed. São Paulo: Editora Ática, 2001.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? São Paulo: Editora 34, 1997.
HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001.
KONDER, Leandro. O que é a dialética. São Paulo: Editora Brasiliense, 1998.

1 comentário:

.'.V.'.M.'. disse...

Parabens pelo texto da Fidelidade e Maçonaria